A Assembleia Municipal discutiu e aprovou por unanimidade o Regulamento de Acesso ao Centro Histórico de Guimarães.
Este regulamento, em substância, não trás quase nada de novo, e limita-se a passar a escrito as restrições habitualmente implementadas para aquele espaço.
Resumidamente, o regulamento impede o trânsito e estacionamento na zona intramuros das 21:30 às 7:00.
Fui à assembleia para ouvir argumentos, e para deixar expressa a minha opinião, mas não tive coragem para intervir.
Deixo aqui o que tinha escrito para lá falar:
Desde há muito que a mobilidade em Guimarães tem merecido a minha atenção e intervenção, e o que me traz aqui hoje é o novo regulamento de acesso ao centro histórico.
O Centro Histórico de Guimarães é património mundial há dez anos.
A UNESCO, no documento de nomeação de Guimarães a Património Mundial, no capitulo que fala dos fatores que afetam o “bem” (Centro Histórico), refere o automóvel em 3 dos seus 6 pontos, que eu resumi da seguinte forma:
- A circulação e estacionamento colidem com o espaço dos peões.
- A poluição sonora, visual e atmosférica afetam os visitantes.
- A circulação automóvel, acelera a degradação dos edifícios.
O que eles referem é óbvio, e creio que todos concordarão com essa leitura.
No entanto, e dez anos volvidos, o que foi feito para reverter a situação? Quase nada.
Estivemos dez anos a marcar passo, e quando temos a Capital Europeia da Cultura na nossa cidade, a justificar e exigir um passo firme e determinado rumo à pedonalização, o que é que fazemos?
Damos um passinho, tímido e medroso.
Ouço dizer repetidamente que temos que “receber bem” para colher os frutos da CEC no pós 2012, mas será que sujeitar quem nos visita a conviver com o automóvel em boa parte do nosso centro histórico é “receber bem”?
As cidades que concorrem com Guimarães pelos turistas certamente agradecem.
No preâmbulo do regulamento diz-se pretender “proteger e melhorar as condições de fruição e preservação do Centro Histórico intramuros, reduzindo o impacto negativo, estético e ambiental, da circulação automóvel e potenciando a mobilidade pedonal, designadamente dos visitantes”.
Acreditam sinceramente que condicionar o acesso entre as 21:30 e as 7:00 fará cumprir os objetivos pretendidos?
O tráfego nesse período corresponde a que percentagem diária?
Foi feito algum estudo? Sabem quantos, porquê e em que horários se acede ao CH?
Eu calculo que o período de acesso condicionado não ultrapassará os 10% do tráfego diário, pelo que pergunto: que problemas serão resolvidos?
Será que diminui substancialmente a passagem de carros pelo CH? Não.
Diminui o conflito com os peões? Não. Não é esse o período de maior afluência de peões.
Protege o edificado dos malefícios da circulação automóvel? Também não.
O Sr. Presidente da Câmara afirmou estes dias a um jornal que não admitirá que “a recolha de imagens de um monumento seja ferida por algo que não lhe corresponde”.
Dou um prémio a quem conseguir encontrar à venda um postal do Largo da Misericórdia (deste século). Porque será? Não é por falta de monumentos.
Até quando essa “pérola” da “jóia da coroa” vai continuar a ser um parque automóvel?
Quero deixar claro que não defendo soluções fundamentalistas.
Não defendo a proibição total de automóveis ao centro histórico, mas sim o acesso condicionado, acompanhado de incentivos à fixação de moradores e comércio.
Querer um centro histórico liberto de automóveis não é fundamentalismo.
Fundamentalismo, é submeter o centro histórico ao jugo do automóvel.
Fundamentalismo, é saber que as ruas do centro histórico não foram construídas nem dimensionadas para carros, mas mesmo assim, afetar 70 a 80% do seu espaço para uso do automóvel.
Fundamentalismo, é querer estacionar 15 carros na Rua do Retiro, ou 20 na Rua João de Melo.
Quando tomei conhecimento que estariam a preparar este regulamento, e tendo a perceção de que todos os partidos defendem o condicionamento automóvel no centro histórico, criei algumas expetativas, mas como diz o ditado, “a montanha pariu um rato”. E dos pequenos.
É minha convicção, que se este regulamento não for revisto a curto prazo, continuaremos a marcar passo.
Haja coragem!
Em aditamento ao que escrevi na altura, acabo com uma frase do presidente da câmara, proferida nessa assembleia: “Só governa quem desagrada, se for caso disso.”
José Cunha