Svetlana Alexievitch
Vozes de Chernobyl – história de um desastre nuclear
“-A Zona…Um mundo à parte…Foi primeiro inventado pelos escritores de ficção científica, mas a literatura retrocedeu perante a realidade.”
Há quem julgue que o prémio Nobel se ganha por causa de um único livro. Se fosse esse o caso, só poderia ser este o livro que deu em 2015 o Prémio Nobel da Literatura à escritora bielorrussa Svetlana Alexeievitch…
Este é um livro sem narrador, ou melhor, com múltiplos narradores, que são as “vozes” de todos aqueles que sofreram direta ou indiretamente o maior desastre nuclear da história. Escutamos as vozes dos que foram forçados a partir e nunca mais voltaram, as vozes dos que se recusaram a partir e ficaram, as vozes daqueles que partiram e insistiram em regressar… e as vozes daqueles que vieram porque a radiação era uma adversidade preferível a uma guerra fratricida.
O livro não tem explicações científicas nem desculpas políticas. Abre com um relato pungente da mulher de um bombeiro, uma das primeiras vítimas do acidente, que acorreu ao que se pensava ser um simples incêndio numa central nuclear… É um relato violento, uma autêntica via dolorosa que acumula o desnorteio vivido nos primeiros dias após o acidente. Depois há uma multidão de vozes que sussurram sofrimento e incompreensão, mas também fascínio e atração por um mundo morto e uma terra fantasma.
Numa altura em que as vozes atuais se dividem a favor ou contra a central nuclear de Almaraz, recomendamos a leitura desta obra para melhor compreensão dos efeitos invisíveis da radioatividade. Será que devemos confiar na voz de governantes que apelam à “tranquilidade” e que afirmam que o perigo só existe num raio de 30 km à volta da central? Ou vamos deixar-nos guiar pelas vozes da experiência que asseguram que “só os escaravelhos da batata andam felizes da vida (…) a comer as nossas batatinhas” depois de um acidente nuclear?
As Vozes de Chernobyl
de Svetlana Alexievich
Trad. Galina Mitrakhovich
Elsinore: Amadora, 2016, 328 p.

Kostin Igor/Corbis Sygma